sábado, 29 de novembro de 2008

U-turn

Tudo sobre o renascer pós-artístico, pós-moderno e pós-mortem do Rogério Nuno Costa after Kant after Duchamp. Das cinzas. E das ideias. Soluções devidamente finlandizadas para a próxima década. Sem artes. Nem ofícios. Só virtualidades. Só Ubiquidades. Não queremos mais existir. Queremos e-xistir: empate técnico. Terceira Via™. O verdadeiro fim do fim.


Universidade:
A partir de 2012, noutro sítio que não este.





SINTOMAS EM ERUPÇÃO, NESTE BLOG, E NESTE.




sábado, 11 de outubro de 2008

PROTOACADEMIA MEDIEVO-CONTEMPORÂNEA



NEM NEGAÇÃO, NEM ACEITAÇÃO; GRATIDÃO!



A Magna Reitoria da Protoacademia Medievo-Contemporânea "The Curator's School" informa que o seu principal mentor e instrutor, Rogério Nuno Costa, estará nos próximos dias 13, 14 e 15 de Outubro na cidade holandesa de Arnhem, a dirigir um curso inserido no master program em Coreografia da escola ArtEZ, Dance Unlimited. Será esta mais uma experiência-piloto com vista à instauração da "Universidade" [projecto universal, universitário e universalizante], com arranque previsto para o ano lectivo 2011/2012. Todas as informações relativas ao "Processo de Vila do Conde", proposta para uma reforma estrutural do ensino meta-artístico, será tornada pública ainda este ano. a "Universidade" não é um projecto artístico. Não nega, nem aceita; agradece! Bem-vindos à Terceira Via™; bem-vindos à era do empate técnico. Brevemente, num ecrã perto de si...


NEM NEGAÇÃO, NEM ACEITAÇÃO; GRATIDÃO!

 
 


quarta-feira, 16 de abril de 2008

VIGIAR E PUNIR

©Ange Leccia, "Arrangement Stasi", 1990


(...) Ora, o estudo desta microfísica supõe que o poder nela exercido não seja concebido como uma propriedade, mas como uma estratégia, que seus efeitos de dominação não sejam atribuídos a uma "apropriação", mas a disposições, a manobras, a tácticas, a técnicas, a funcionamentos; que se desvende nele antes uma rede de relações sempre tensas, sempre em actividade, que um privilégio que se pudesse deter; que lhe seja dado como modelo antes a batalha perpétua que o contrato que faz uma cessão ou a conquista que se apodera de um domínio. Temos em suma que admitir que esse poder se exerce mais que se possui, que não é o "privilégio" adquirido ou conservado da classe dominante, mas o efeito de conjunto de suas posições estratégicas — efeito manifestado e às vezes reconduzido pela posição dos que são dominados. Esse poder, por outro lado, não se aplica pura e simplesmente como uma obrigação ou uma proibição, aos que "não têm"; ele investe-os, passa por eles e através deles; apoia-se neles, do mesmo modo que eles, na sua luta contra esse poder, apoiam-se por sua vez nos pontos em que este os alcança. O que significa que essas relações aprofundam-se dentro da sociedade, que não se localizam nas relações do estado com os cidadãos ou na fronteira das classes e que não se contentam em reproduzir ao nível dos indivíduos, dos corpos, dos gestos e dos comportamentos, a forma geral da lei ou do governo; que se há continuidade (realmente elas articulam-se bem, nessa forma, de acordo com toda uma série de complexas engrenagens), não há analogia nem homologia, mas especificidade do mecanismo e de modalidade. Finalmente, não são unívocas; definem inúmeros pontos de luta, focos de instabilidade comportando cada um seus riscos de conflito, de lutas e de inversão pelo menos transitória da relação de forças. A derrubada desses "micropoderes" não obedece portanto à lei do tudo ou nada; ele não é adquirido de uma vez por todas por um novo controle dos aparelhos nem por um novo funcionamento ou uma destruição das instituições; em compensação, nenhum de seus episódios localizados pode ser inscrito na história senão pelos efeitos por ele induzidos em toda a rede em que se encontra. Seria talvez preciso renunciar também a toda uma tradição que deixa imaginar que só pode haver saber onde as relações de poder estão suspensas e que o saber só pode desenvolver-se fora das suas injunções, das suas exigências e dos seus interesses. Seria talvez preciso renunciar a crer que o poder enlouquece e que, em compensação, a renúncia ao poder é uma das condições para que se possa tornar-se sábio. Temos antes que admitir que o poder produz saber (e não simplesmente favorecendo-o porque o serve ou aplicando-o porque é útil); que poder e saber estão directamente implicados; que não há relação de poder sem constituição correlata de um campo de saber, nem saber que não suponha e não constitua ao mesmo tempo relações de poder. Essas relações de "poder-saber" não devem então ser analisadas a partir de um sujeito do conhecimento que seria ou não livre em relação ao sistema do poder; mas é preciso considerar, ao contrário, que o sujeito que conhece, os objectos a conhecer e as modalidades de conhecimento são outros tantos efeitos dessas implicações fundamentais do poder-saber e de suas transformações históricas. Resumindo, não é a actividade do sujeito de conhecimento que produziria um saber, útil ou arredio ao poder, mas o poder-saber, os processos e as lutas que o atravessam e que o constituem, que determinam as formas e os campos possíveis do conhecimento.

[Michel Foucault, in "Vigiar e Punir", 1975]



sábado, 8 de março de 2008

PHANTASMAS

O FIM DA OBRA SINGULAR
OU O FIM DA OBRA ENQUANTO SINGULARIDADE





É necessário impedir que as consequências sejam menosprezadas. Pequenos achados como este — o da reprodutibilidade — podem ser suficientes para subverter em profundidade todas as economias do imaginário. E arrastadas por estas, uma vez modificadas as ordens simbólicas, também o serão as economias do próprio real na sua totalidade. Mas para tal é necessário refrear o trabalho de neutralização, de desactivação sistemática, levado a cabo pelas inércias da instituição ou do mercado. É necessário impedir que actuem com eficácia os mecanismos por estas congeminados para que, por mais que tudo mude, tudo permaneça igual. É necessário afirmar com a maior das contundências o fim da obra como singularidade, daí extraindo e exigindo que sejam extraídas todas as consequências. Deve recusar-se qualquer tipo de conivência: qualquer condescendência — incluindo, em particular, a do "controlo de tiragem" — é cúmplice; é nela que as estruturas inerciais do sistema se apoiam.

Não há uma única obra singular que pertença por direito próprio a este tempo. Ou habita um tempo emprestado e fala então ao ouvido de outras épocas — nada diz à nossa que esclareça e traga à luz a problematicidade das suas próprias condições de representação —, ou abandona-se à formidável vertigem da sua existência incontida, numa cascata de multiplicações de que o infinito número dos seus avatares denuncia a equivalência radical, ontológica, entre produção e reprodução, entre origem e eco distribuído. Para o nosso tempo, a existência particularizada das coisas, dos objectos do mundo, é uma quimera esbatida, um pesadelo suspenso. Como para os grãos de areia de uma praia ou para as agulhas dum pinheiro, qualquer nomeação que não seja mera enumeração molar pertence à ordem do delírio esquizóide. Não há nomes no mundo que consigam sujeitar (pois que se trata da mesma operação que procura subjectificar os objectos para que estes expressem a veracidade da existência particular daqueles que os afrontam, daqueles que os designam) a imparável multiplicidade niveladora daquilo que existe, daquilo que habita o mundo nas tortuosidades imprevisíveis de milhares de milhões de séries infinitamente descentradas, abertas e entrecruzadas numa trama febril e inabarcável.

É desta grande revolução metafísica epocal, que nomeia o desaparecimento do ser do mundo enquanto algo inscrito nas presunções contidas dos seus particulares, que deve falar a obra do nosso tempo. Que para fazê-lo tenha de testemunhar — e não ocultar — a sua própria impossível singularidade, eis a sua força. O tempo em que as artes tinham por missão dar conta do imaginário dum mundo dos seres particulares é o tempo de um projecto finado, um tempo morto. E felizmente morto — por ser fraudulento, por negar o ser no seu desvendamento infinitésimo e inumerável, como epifania radical da diferença.

Temos contudo de precaver-nos dos mortos, pois há zombies que caminham entre nós, murmurando ainda sobre "os mortos que haveis matado" ao mesmo tempo que, inexistindo, conservam todo o controlo dos aparelhos do estado, do poder (que é a forma pela qual se apresenta aquilo que não vive). A ordem dos singulares que estes defendem — e na qual são, se é que tal atributo pode ser para eles e em alguma medida real — assenta nessas truculências seculares, milenares. Devido ao seu poder, o reino deste mundo pertence-lhes. A autêntica revolução pendente passaria então por escorraçá-los dele — ou, mais precisamente, por devolvê-los a esse outro reino a que por direito pertencem: o das mais obscuras sombras, o do phantasma enquanto cenário — ou estrutura da consciência desditosa — constituído no território das restituições falsificadoras da falta.

[in “A obra de arte e o fim da era do singular”, José Luís Brea, Revista de Comunicação e Linguagens, n.º 37, 2006/2007, Relógio d’Água Editores, 2007, pp. 112-113]



quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

SECRET STORY

Histórico MSN
#01



ELE— Só uma frase, antes das férias: "Não partir das boas coisas velhas, mas das más coisas novas". EU— Tenho andado a falar muito por citações, ultimamente. Começo a achar que não tenho personalidade própria: é tudo roubado de outras pessoas... ELE— É como o António Pedro Vasconcelos. Está sempre a citar. E é muito culto, o que só piora. EU— Eu não sou muito culto. Sou é fundamentalista em relação ao pouco que sei. O que só piora. ELE— Ouvi dizer que se estivéssemos no século XV, serias inquisidor. EU— Como quase toda a gente é herege, tal é a razão pela qual quase ninguém gosta de mim. ELE— "Toda a gente" diz que és um tiranete. Mas eu desconfio sempre de "toda a gente". EU— Quem me dera ser um tiranete! Sou inofensivo, infelizmente... ELE— Ainda bem! EU— Tenho o problema de ser demasiado apaixonado pelas coisas em que acredito. Sou um grande cromo, é o que eu sou. Um totó das artes. Um crominho das performances. ELE— Eu gosto disso! E isso não é problema, é virtude. EU— E fico furioso (faço birra, mesmo) quando vejo coisas/pessoas que vão contra aquilo que eu defendo. ELE— O que importa é que o teu trabalho faça prova do que dizes. Eu sou aberto a todas as perspectivas: desde que não me digas que és filósofo... EU— Deus me livre! Não digo. Fica prometido... Mas e se dissesse? ELE— Arte e Filosofia são coisas diferentes. E se não são, então teremos que meter a Matemática ao barulho. EU— Venha ela... ELE— Há que saber matemática avançada para se estar na vanguarda. EU— De acordo. ELE— E se calhar isso demora mais tempo do que as décadas todas que o Cézanne levou a olhar a montanha Sainte Victoire. Eu, felizmente, como separo Arte e Filosofia, não tenho de me preocupar com a Matemática. EU— O Cézanne é uma excelente arma de arremesso contra aqueles que me acusam de andar há 4 anos a trabalhar na mesmíssima coisa. ELE— E fazes bem, mas sabes que há exemplos na História para defender todos os pontos de vista. A história é muito democrática... EU— Felizmente para uns, infelizmente para outros. ELE— Vou estar atento aos podcasts do MIT. Porque deste ponto de vista, o Media Lab é onde se está a fazer a arte contemporânea. EU— Inteiramente de acordo. ELE— Estás a ver quanta imbecilidade conseguimos nós desmascarar numa só conversa? EU— Eu vou desistir, sabias? Só para chatear os meus amigos... Como fez o Duchamp. ELE— Não. Desistir é feio... EU— A Laurie Anderson é que dizia que os terroristas são os verdadeiros artistas, pois são as únicas pessoas no mundo capazes de mudar as coisas... Não desisto, portanto: dedico-me a matar pessoas feias, "que é uma arte de respeito". ELE— A única "arte de respeito" é a "arte do futuro". Aliás, é a única que existe. EU— Não podia estar mais de acordo. ELE— E o futuro inventa-se. EU— Olha, vamos fazer um coffee break neste nosso debate. Preciso de ir jantar. ELE— E eu preciso de ir fazer as malas. A questão dos negros na arte portuguesa também me interessa, mas fica para depois. You stay cool, Roger! EU— Yes! Até logo...

[Junho 2007]